O ministro participou nesta sexta-feira (31) do debate O STF e a defesa da democracia, promovido pela Fundação FHC. Durante a palestra, Moraes lembrou, inclusive, que nesse período as chamadas milícias digitais tentaram “massacrar” o Poder Judiciário. Inclusive ameaçando ministros familiares, divulgando endereço, roteiro diário, horários dos magistrados, “tudo por rede social, por grupos”. Circularam até plantas do STF “para colocar bomba aqui, bomba ali”.
Apesar tudo, o Brasil vive o maior período republicano de estabilidade democrática, avalia Moraes, enfatizando a Constituição de 1988. “Com erros e acertos, mas esse novo equilíbrio foi dando certo. O Brasil passou por dois impeachments, foram mais de 100 mandados de segurança, somando os dois casos, todos os partidos jogaram as regras do jogo. Os dois presidentes saíram, os vices assumiram, e nós tivemos eleições subsequentes, quem foi eleito assumiu”, afirmou, acrescentando uma ponderação: “Estabilidade não significa tranquilidade sempre. O que (a Constituição) tem que garantir, e a meu ver garante, são mecanismos para que possamos tratar dessas questões.”
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Mas os ataques à democracia não representam uma questão apenas brasileira, acrescentou o ministro. “Tivemos no mundo todo uma captura pela extrema direita das redes sociais. Com uma clara finalidade. O ataque à democracia, a quebra das regras democráticas. De forma absurdamente competente. A extrema direita primeiro diagnosticou e depois capturou todas as redes sociais. E extrema extrema extrema mesmo, estava escondidinha, principalmente nos Estados Unidos. Passou a estudar essa questão e, principalmente, a se apoderar desses mecanismos.”Isso aconteceu, na análise do ministro, com ataques metódicos ao que ele aponta como os pilares da democracia, para desgastá-la: liberdade de imprensa, eleições livres e Judiciário autônomo. “É impressionante a incapacidade do restante da sociedade em pelo menos equilibrar. A extrema direita domina as redes”, constata.
O primeiro passo foi desacreditar a imprensa. Por meio da “equiparação” entre informação e desinformação, com a notícia falsa, como se tivessem o mesmo peso. Dessa forma, observou Moraes, grande parte da população dá ao mesmo crédito a informações vindas de profissionais da comunicação e de “influenciadores”, que opinam “desde a guerra da Ucrânia até a final do campeonato paulista”. Gente que “entende de tudo”, ironiza, fazendo também um mea culpa. “Nós subestimamos. Teve método. Todos os pretensos candidatos a ditador criticam a imprensa – “comunista”, “imprensa lixo” – e criam a sua máquina de notícias.
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O fim do Estado de direito
O segundo passo foi questionar as eleições. Em vez de atacar diretamente a democracia, atacar a forma de votar, como ocorreu na campanha contra as urnas eletrônicas. “Essa desinformação ganhou patamares absurdos. Se o voto fosse impresso, o ataque seria ao voto impresso. Não importa qual mecanismo escolhido, vamos atacar o mecanismo”, comentou o ministro.
Ele enfatizou o papel do Supremo nesse processo. E questionou: se a Corte “abaixasse a cabeça”, como esperar que um juiz da comarca, por exemplo, enfrentasse os políticos locais? “Seria a queda do Estado democrático de direito. Hoje é rojão, amanhã é tiro e depois de amanhã é bazuca. Essas pessoas perderam a vergonha de ameaçar de morte os ministros do Supremo Tribunal Federal, como se isso fosse a normalidade institucional”, reagiu Moraes, citando os “argumentos recorrentes, como “a liberdade de expressão” ou mesmo a imunidade parlamentar. “A minha imunidade permite que eu mate um ou dois ministros”, ironizou.
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Intervenção militar
Sem citar nomes em momento algum, o ministro do STF e presidente do TSE falou sobre a presença de pessoas diante de quartéis pedindo “intervenção militar”. E a tentativa – dos bolsonaristas – de “melar” as eleições afirmando que 30 mil inserções de rádio haviam sido suprimidas. “Um negócio patético, se não fosse agressivo à democracia.” Ele também apontou o paradoxo de um partido (PL) pedir impugnação da eleição presidencial depois de eleger 99 deputados, “quase 20% da Câmara”, além de senadores e governadores.
Sobre o 8 de janeiro, ele disse considerar “estranho” o timing da ação, mas lembrou que as investigações prosseguem e que é preciso continuar vigilante. “As milícias digitais não acabaram, essa desinformação, essas ideias fascistas, de ódio, saíram do bueiro. O bueiro foi destampado. Essas pessoas tem que ser responsabilizadas (para mostrar que) não é fácil atentar contra a democracia. É um negócio assustador o que essa lavagem cerebral das milícias digitais esta fazendo com inúmeras pessoas. Não é possível nós subestimarmos de novo.”
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Regulação das big techs
Uma das perguntas do público foi como responsabilizar as empresas de tecnologia, as chamadas big techs. “Algo precisa ser feito. E ninguém duvida disso, inclusive as empresas. Elas perceberam que essa instrumentalização que sofreram a médio e longo prazo é contra elas também. Elas perceberam também o perigo.”
Para o ministro, esses grupos não podem, juridicamente, continuarem sendo vistos como empresas de tecnologia, “sem nenhuma responsabilidade pelo que divulgam”. Por outro lado, uma regulação deve evitar a “armadilha” da extrema direita, sempre pronta a bradar sobre liberdade de expressão. Na presença do deputado Orlando Morais (PCdoB-SP), relator de projeto sobre fake news, ele propôs regras mais básicas, que poderiam ser reavaliadas daqui a um ano. Moraes propõe . regras básicas – para reavaliar daqui a um ano, por exemplo. “Nós não precisamos inovar. Vamos transportar o que já é sedimentado em termos de liberdade de expressão.” Seria, assim, um transporte do mundo real para o virtual. O que uma pessoa não publicaria em um artigo por saber dos riscos jurídicos também valeria para declarações nas redes.
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Moderação e judicialização
No início da palestra, o ministro afirmou que o Judiciário, no Brasil, somente passou a ter a mesma força que os outros poderes a partir da Constituição de 1988. E passou a atuar como moderador, “em que pese alguns lamentavelmente” darem interpretação equivocada ao artigo 142 da Constituição, atribuindo esse papel às Forças Armadas.
A chamada “judicialização” da política, a seu ver, existe porque os partidos acionam constantemente o STF. “Tudo chega (à Corte). Um partido pode entrar com uma ação direta por dia. e entra. No congresso, quem perdeu leva para o Supremo Tribunal Federal, e aí acaba judicializando.”
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