Há quase duas semanas, o Brasil registra crescimento na média móvel de mortes por covid-19. Pelo menos 1.353 pessoas perderam a vida em decorrência do coronavírus a cada um dos últimos sete dias. O resultado confirma o levantamento do projeto de transparência de dados Our World in Data, ligado à Universidade de Oxford, no Reino Unido. Na quinta-feira (4), a publicação digital divulgou que o país ultrapassou os Estados Unidos na média de novas mortes diárias por milhão de habitantes e vive seu pior cenário desde o início da crise sanitária, em março passado.
Em sete dias, o Brasil atingiu uma média de 6,3 mortes diárias por milhão de habitantes, o maior número já registrado no país. Enquanto os Estados Unidos registraram 5,5 mortes causadas por covid a cada milhão de habitantes. Nessa sexta, 05 de março, o país ultrapassou o número de 262 mil vidas perdidas. Até ontem, de acordo com o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), 262.770 brasileiros já morreram por conta do vírus.
Mas o epidemiologista Pedro Hallal, ex-reitor da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL), garante que, desse total de óbitos, cerca de 180 mil “não teriam acontecido caso o Brasil não fosse um fracasso no combate à pandemia”. Em entrevista a Marilu Cabañas, do Jornal Brasil Atual, o professor explicou que esse cálculo significa que “três a cada quatro mortes no Brasil pela covid-19 poderiam ter sido evitadas não fosse o governo federal e o Ministério da Saúde terem um trabalho tão vexatório no enfrentamento da pandemia”.
Cortina de fumaça bolsonarista
De acordo com Hallal, o governo cooperou para a falta de uma política de testagem e de rastreamento dos infectados em larga escala. Assim como agiu por um a campanha “difamatória”contra o distanciamento social e a possibilidade de lockdown. E boicotou a vacinação, além de defender “tratamento precoce” sem eficácia científica. O “conjunto desses fatores”, afirma ele, “é que faz com que essas famílias estejam em luto, quando na verdade não precisariam, se essas coisas não tivessem acontecido”, destaca.
O epidemiologista adverte ainda sobre a postura negacionista do presidente. Nesta quinta, no município de São Simão, em Goiás, ele voltou a atacar as determinações de fechamento de atividades não essenciais, falando em “frescura” e “mimimi”. Bolsonaro chamou também de “idiota” quem cobra agilidade de seu governo no processo de aquisição de vacina. “Só se for na casa da tua mãe, não tem vacina para vender no mundo. Mas onde vai parar o Brasil se nós pararmos?”, disparou.
“Essa é uma retórica agressiva que tenta criar cortina de fumaça, como sempre tem sido, para não ficar escancarado o absoluto fracasso brasileiro no combate à pandemia. Essas famílias que estão em luto mereceriam um pouco mais de respeito do que uma declaração como essa”, contesta Hallal.
Ataque frustrado
Recentemente, o professor teve de assinar Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) acordado pela Controladoria-Geral da União (CGU). O processo foi aberto pelo deputado federal Bibo Nunes (PSL-RS). Isso após Hallal emitir críticas públicas a Bolsonaro em canais da UFPEL, em 7 de janeiro. O parlamentar ingressou com a representação com a intenção, inclusive, de exonerá-lo da universidade.
Hallal conta que a CGU acabou afastando qualquer possibilidade de falta funcional grave, mas vislumbrou que haveria “infração disciplinar de baixo potencial ofensivo”. E, após conversas com colegas e seus advogados, o epidemiologista assinou o TAC para arquivar de vez o processo. Contudo, ele considera que esse foi um “ataque frustrado”. “Porque obviamente esse processo não fará com que eu deixe de me manifestar sobre a pandemia, as vexatórias atuações até hoje do Ministério da Saúde e do próprio governo federal em relação ao coronavírus”, critica.
As denúncias de Hallal sobre a situação do país já foram parte inclusive na revista científica The Lancet. Numa das mais antigas e conhecidas revistas do tipo, o epidemiologista publicou uma carta chamada SOS Brasil: Ataques à Ciência, em referência ao governo Bolsonaro e às mortes por covid que provoca.
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