sábado, 24 de abril de 2021

Grampos sugerem que amigos do miliciano Adriano da Nóbrega buscaram ajuda do Bolsonaro

                                              Reprodução
 Por Sérgio Ramalho, Intercept Brasil - Diálogos transcritos de grampos telefônicos sugerem que o presidente Jair Bolsonaro foi contactado por integrantes da rede de proteção do ex-capitão do Bope Adriano da Nóbrega, chefe da milícia Escritório do Crime. As conversas fazem parte de um relatório da Subsecretaria de Inteligência da Secretaria de Polícia Civil do Rio elaborado a partir das quebras de sigilo telefônico e telemático de suspeitos de ajudar o miliciano nos 383 dias em que circulou foragido pelo país.

Logo após a morte do miliciano, cúmplices de Adriano da Nóbrega fizeram contato com “Jair”, “HNI (PRESIDENTE)” e “cara da casa de vidro”. Para fontes do Ministério Público do Rio de Janeiro ouvidos na condição de anonimato, o conjunto de circunstâncias permite concluir que os nomes são referências ao presidente Jair Bolsonaro. “O cara da casa de vidro” seria uma referência aos palácios do Planalto, sede do Executivo federal, e da Alvorada, a residência oficial do presidente, ambos com fachada inteiramente de vidro.

Após as citações, o Ministério Público Estadual pediu que a justiça encerrasse as escutas dos envolvidos nas conversas, apesar de eles seguirem trocando informações sobre as atividades ilegais de Adriano da Nóbrega. A interrupção reforça a ideia de que trata-se do mesmo Jair que hoje ocupa o Planalto. O MP estadual não pode investigar o presidente da República. Em casos deste tipo, tem a obrigação constitucional de encerrar a investigação e encaminhar o processo à Procuradoria Geral da República, que tem esse poder. Questionada pela reportagem, a PGR não informou se recebeu ou não a investigação do MP do Rio até a publicação desta reportagem.

O Intercept já havia reportado sobre as escutas em fevereiro, quando mostramos como Adriano dizia que “se fodia” por ser amigo do presidente da República, e em março, quando detalhamos a briga pelo espólio deixado pelo ex-caveira. As referências a “Jair” e “cara da casa de vidro” constam em novos documentos recebidos pela reportagem, que, em conjunto com as escutas anteriores, permitem entender a amplitude das relações do miliciano e da rede que lhe deu apoio no período em que passou foragido.

Adriano da Nóbrega fugia da justiça desde janeiro de 2019, quando o Ministério Público do Rio pediu a sua prisão, acusando-o de chefiar a milícia Escritório do Crime, especializada em assassinatos por encomenda. Ex-integrante da elite do batalhão de elite da Polícia Militar do Rio, ele foi expulso da corporação em 2014 por relações com a máfia do jogo do bicho.

As conversas de apoiadores do miliciano com supostas referências ao presidente começaram a aparecer nos grampos a partir do dia da morte de Adriano, em 9 de fevereiro de 2020, e continuaram por mais 11 dias. No dia 9 pela manhã, o miliciano foi cercado por policiais do Rio e da Bahia, quando se escondia no sítio do vereador Gilson Batista Lima Neto, o Gilsinho de Dedé, do PSL, em Esplanada, cidade a 170 quilômetros de Salvador. Segundo os agentes, o miliciano reagiu a tiros a ordem de se render. Os policiais reagiram e mataram Adriano com dois tiros.

‘Cara da casa de vidro’


De acordo com as transcrições, a primeira ligação supostamente feita ao presidente aparece no dia 9 de fevereiro de 2020 à noite, horas depois que Adriano foi morto. Ronaldo Cesar, o Grande, identificado pela investigação como um dos elos entre os negócios legais e ilegais do miliciano, diz a uma mulher não identificada (MNI, no jargão policial) que ligaria para o “cara da casa de vidro”. No telefonema, demonstra preocupação com pendências financeiras e diz que alertou Adriano que “iria acontecer algo ruim”. Ele fala ainda que quer saber “como vai ser o mês que vem” e que a “parte do cara tem que ir”.

Identificado pela polícia como ele entre os negócios legais e ilegais do miliciano, Grande diz que vai “ligar para o cara da Casa de Vidro”.

Quatro dias após a morte de Adriano, em 13 de fevereiro de 2020, Grande fala com um homem supostamente não identificado (HNI), que tem ao lado, entre parênteses, a descrição “PRESIDENTE” em letras maiúsculas, e relata problemas com a família de Adriano devido à divisão de bens. O interlocutor se coloca à disposição caso ele venha a ter algum problema futuro. Apenas duas frases do diálogo de 5 minutos e 25 segundos foram transcritas.

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